segunda-feira, 30 de julho de 2012

Crítica de "Batman - O Cavaleiro das Trevas Ressurge"

A história do Homem-Morcego nos cinemas começa no ano de 1989. Tim Burton dirigiu os dois primeiros filmes, com Michael Keaton no papel de Bruce Wayne. O primeiro filme, "Batman", e "Batman-O Retorno", trouxeram vilões clássicos do herói para os cinemas, como Coringa, Pinguim e Mulher-Gato. Os dois filmes foram satisfatórios, e o primeiro, inclusive, venceu o Oscar de melhor direção de arte, e destaque para as atuações de Jack Nicholson como o Coringa e Michelle Pfeiffer como a Mulher-Gato. Antes, houve o filme com os atores da série de TV, Adam West e Burt Ward, mas era uma versão bem mais cartunesca deste.

Aí, veio Joel Schumacher com "Batman Eternamente". O papel de Bruce Wayne ficou agora com Vak Kilmer. Apesar da boa atuação de Jim Carrey como Charada, este filme foi bem inferior aos seus antecessores, por ser muito "colorido", artificial, e com uma história bastante infantil. E, contrariando a "célebre" frase do deputado Tiririca, "pior do que tá, fica." Eis que em 1997 Joel Schumacher nos traz "Batman e Robin", um filme cuja fantasia do Homem Morcego e de Robin parecia mais fantasias de Carnaval, onde vimos um Bane cheio de músculos e acéfalo, uma Gotham nada realista, era uma cidade totalmente artificial, sem falar dos inacreditáveis mamilos na fantasia, e a BatGirl originalmente, ser filha do Comissário Gordon, e neste filme, é a sobrinha do Mordomo Alfred, sem falar nos personagens bastante cartunescos Mr. Freeze e Hera Venenosa, vividos por Arnold Schwarzenegger e Uma Thurman, respectivamente. Merecidamente foi indicado para o Framboesa de Ouro em 11 categorias.(o "Oscar" dos piores filmes do ano.)

Mas, em 2005, coube a Christopher Nolan reiniciar toda a franquia do guardião de Gotham. Christian Bale, de "Psicopata Americano", estava na pele do bilionário dono das Empresas Wayne. O diretor, com uma abordagem sombria e com um visual remetente ao dos quadrinhos, nos mostrou a origem do Homem Morcego desde o assassinato dos seus pais, a "formação" deste na Liga das Sombras, e como ele usou o morcego, um animal no qual sentia medo, para provocar medo nos outros. Então, numa história que mescla aventura e filme policial, Nolan enfim nos mostrou aquele Batman que todos queriam ver. Ra's Al Ghul, o líder da Liga das Sombras, já dizia: “Se você se tornar mais do que um simples homem, se você se dedicar a um ideal e se eles não puderem parar você, então você se torna algo totalmente diferente…. uma lenda, Sr. Wayne. Então, presenciamos o surgimento da "lenda", que consegue impedir a destruição de Gotham pelo medo, e impedir os planos do Espantalho. Destaque também para Gary Oldman como o Comissário Gordon, Michael Caine como Alfred, e Morgan Freeman como Lucius Fox, uma espécie de agente "Q" para o Batman.

Depois do ótimo primeiro filme, "Batman-O Cavaleiro das Trevas"(2008) foi ainda mais espetacular. Com uma verdadeira história policial, Heath Ledger, que faleceu poucos meses antes do filme estrear nos cinemas, fez uma das melhores atuações da história do cinema como o Coringa, um lunático anarquista, que tinha um plano complexo para destruir o Batman, seja mesmo no seu tom de voz, no seu olhar. Alguns frases célebres do personagem, como "Aquilo que não nos mata, nos torna mais estranho", é uma frase clara de como ele usou provavelmente um trauma do passado(possui o rosto com cicatrizes e usa uma maquiagem para escondê-las) para pôr em prática sua loucura. Este mesmo vilão conseguiu trazer o melhor dentre os "caras da lei", o promotor Harvey Dent, que junto com o Comissário Gordon e Batman colocavam em prática um plano para por toda a máfia atrás das grades. O plano vai bem, até o Coringa começar a atacar entes queridos do promotor, e ao mesmo tempo, do Batman. Também presenciamos um lado bem mais humano de Bruce Wayne. Este está em busca de "um herói sem máscara", a acredita que um dia Gotham não precisará mais de seu guardião, e que neste dia Rachel, sua amiga de infância, pela qual este nutre um sentimento especial, estaria ao seu lado. Com o Coringa pondo seu plano em prática, ele acaba levando o promotor à loucura, segundo o próprio, "rebaixando o melhor entre os defensores da lei, e rebaixando até o seu nível. Segundo este, "a loucura é como a gravidade, só precisa de um empurrãozinho". Este ser anarquista, que não mede esforços para ver a cidade de Gotham ruir, acaba "vencendo" no final, pois Harvey Dent, que sofrera uma queimadura na metade do rosto graças a um plano do Coringa, havia ficado com sua face parcialmente queimada. Interessante o jogo de luzes do diretor Nolan na cena final. Metade do rosto do ator Aaron Eckhart está no claro, e seu outro lado, está no escuro. O agora vilão Harvey Dent, chamado de "Duas Caras", acaba sucumbindo no final, sendo derrotado pelo Batman após tentar matar a família de Gordon, por culpar o comissário pela morte de Rachel. Na tentativa de manter a cidade de Gotham com seu "herói sem máscara", Batman faz um acordo com o comissário Gordon que irá assumir a autoria do assassinato de Harvey Dent, para que a cidade continua acreditando em um homem comum. Então, vemos na cena final o questionamento de uma criança sobre o que é o Batman e a resposta célebre do Comissário Gordon: "Ele não é o heroi que Gotham precisa, mas o que ela merece. Ele não é um herói. É um guardião silencioso. Um protetor zeloso. Um Cavaleiro das Trevas. Não por menos, Heath Ledger ganhou o Oscar póstumo de melhor ator coadjuvante. Lembrando a excelente atuação de Maggie Gyllenhaal, substituindo Katie Holmes neste filme. A primeira conseguiu dar o tom de carga dramático necessário a personagem, algo que a ex-mulher de Tom Cruise não foi bem sucedida.
Também presenciamos neste filme a relação Bruce-Alfred. O bilionário e seu patrão têm uma verdadeira relação pai-filho, seja com discussões semelhantes a este nível, conselhos e decisões tomadas.


A partir deste ponto, o texto pode conter spoilers.

E, no último filme da trilogia, Batman-O Cavaleiro das Trevas Ressurge, que se passa oito anos após os eventos do filme anterior, vemos Bruce Wayne o tempo todo recluso na sua reconstruída Mansão Wayne, fora da vida pública, o que causa rumores sobre sua sanidade mental. É o aniversário de morte de Harvey Dent, e Gotham City vive um tempo de paz, graças a um lei com o nome do ex-promotor de Gotham bastante eficaz na luta contra o crime. Mas, vemos Bane, interpretado por Tom Hardy, um vilão dotado de músculos, mas não privado de inteligência, com um plano de destruir a maior cidade do planeta através de um plano muito bem estruturado a partir de seu subterrâneo. E é quando somos apresentados a Mulher Gato, vivida por Anne Hathaway, que Bruce Wayne resolve voltar à ativa. Bane tem um plano para com o povo de Gotham, usando um discurso populista, prometendo devolver o poder ao povo, relembrando a época da Revolução Francesa em 1789, e presenciamos uma luta de classes. Quanto a Mulher Gato, só mais a frente fica claro quais as reais intenções desta. Neste filme, somos apresentados ao policial John Blake, cujo passado guarda muitas semelhanças com o Homem Morcego, e Miranda Tate. Esses dois personagens são vitais para o fim da trilogia.

Vimos o surgimento, a queda, e a ascensão da lenda. Quando o vilão convence ao povo a lutar por algo que não é o que parece ser, qual seria a consequência para a população quando esta descobre que viveram por um bom tempo acreditando numa farsa? Batman terá que lidar com este problema, e tem sua recompensa recebida. O final é tão sensacional e com atuações tão memoráveis neste momento do filme, que sempre ficaremos com um gostinho de quero mais. Pontas soltas foram deixadas. A lenda do Batman chega ao seu fim, de maneira épica, espetacular. O guardião de Gotham enfim tem a sua reputação recebida. Christopher Nolan nos mostrou o Batman que queríamos ver, um herói, ao contrário de outros, de carne e osso, que luta por um ideal, e histórias e vilões bastante humanizados, com temas bem contemporâneos, personagens memoráveis, e sem dúvidas, uma conclusão extraordinária, sendo este o melhor da trilogia. Cenas de ação inesquecíveis, em especial uma das lutas de Batman contra Bane, onde na qual presenciamos o desenrolar da luta, e o único som é a água do rio correndo ao fundo. Destaque também para a sequência do prólogo, de tirar o fôlego.

A trilha sonora de Hans Zimmer merece um parágrafo a parte. Este conseguiu superar o espetacular trabalho feito no filme anterior, dando um tom melancólico ao filme em certas cenas.

Christopher Nolan fecha a trilogia com chave de ouro. Um filme épico, com cenas de ação fantásticas, e com carga emocional presente. A lenda do Batman chega ao fim, mas será esta a única lenda que Gotham já presenciou ou poderão vir mais?

Nota: 10

P.S. Como prometido pelo diretor, o Coringa não é citado uma única vez neste filme, como forma de preservar a memória de Heath Ledger. O que eu vejo por aí são muitos comparando o Coringa com Bane. Mas não é possível compará-los, são personagens bem distintos. O único fato é que cada um, ao seu modo, estará para sempre marcado na história do cinema.
Curiosamente, o nome "Mulher Gato" jamais é mencionado no filme.
Ah, os fãs do Batman se lembrarão de ligações diretas com a HQ "A queda do morcego",dentre outras...


Abaixo, os comentários muito coerentes do crítico Pablo Villaça sobre a cena final do filme.

Batman: O Pião Continua a Girar?
Christopher Nolan esteve muito, muito perto de criar, em O Cavaleiro das Trevas Ressurge, um final tão ambíguo quanto aquele de seu longa anterior, A Origem – e caso tivesse encerrado a obra enfocando o sorriso de Alfred no café em Florença e evitado mostrar o que o mordomo vira, o diretor enviaria o público para fora da sala de projeção mergulhado em dúvidas: teria o personagem de Michael Caine visto Bruce Wayne? Seria uma solução orgânica e elegante que permitiria interpretações diferentes de acordo com o temperamento de cada espectador – exatamente como a dúvida que concluíra Inception.
Mas, claro, não é isso que ocorre: após o sorriso de Alfred, vemos Bruce Wayne e Selina Kyle. Os dois homens acenam um para o outro e o mordomo se levanta para abandonar o local com uma alegria inquestionável estampada no rosto. Seu querido patrão (e, mais do que isso, filho) sobrevivera e reconstruíra a própria vida. Exatamente como ele sonhara e descrevera anteriormente na narrativa.
E é justamente por ter enfocado Alfred descrevendo esta fantasia que O Cavaleiro das Trevas Ressurge permite a indagação: seria aquela imagem real? Teria o personagem de Caine realmente visto Bruce em Florença? Ou seria esta apenas uma manifestação de seu desejo?
É possível interpretar a cena como um sonho, não há dúvida: para começar, Selina Kyle está vestindo uma roupa azul – o único instante do filme no qual usa um figurino que não é dominado pelo preto. Da mesma forma, Bruce veste uma camisa de cor alegre, que se contrapõe às cores sóbrias que costuma vestir. Isto para não mencionarmos que a reação de Wayne e Alfred, um leve aceno de cabeça seguido pela partida deste último, é no mínimo implausível considerando o carinho que sentem um pelo outro e o que aquele encontro representa.  Sim, dizer que tudo se resume a uma fantasia do velho empregado da família Wayne não é um absurdo tão grande – e, mais do que isso, representa um desfecho dramaticamente eficaz.
No entanto, é igualmente factível interpretar o contraste nas cores do figurino como sendo uma representação da nova vida criada por Bruce e Selina. E Alfred pode ter se afastado para respeitar a privacidade do antigo patrão, já satisfeito em sabê-lo vivo. E, claro, precisamos considerar que o roteiro se preocupa em incluir uma cena que traz Lucius Fox (Freeman) descobrindo que Wayne consertara o piloto automático do helicóptero, o que explicaria (com muito boa fé por parte do espectador) a escapada do herói – mesmo que possamos perguntar como a nave sobrevivera quase intacta à explosão da bomba e à queda subsequente.
Em outras palavras: se o desfecho de A Origem era de uma ambiguidade calculada, aqui esta depende mais do público do que do cineasta, que, sejamos honestos, claramente enxerga um futuro otimista para seu protagonista.

Mas esta é a beleza da Arte: ela só se completa com a participação do observador. E eu, particularmente, prefiro completá-la com a morte de Bruce Wayne.



E vocês, o que acham desta teoria?

4 comentários:

  1. Simplesmente a-me-i esse post sobre o filme, sua crítica está perfeita, pontuou detalhes importantes de toda a história do Batman; abordou pontos baixos e pontos altos de todos os filmes; recapitulou pontos-chave principalmente da era Nolan, definitivamente a mais bem produzida de todas. Ainda não vi o filme Batman - O Cavaleiro das Trevas Ressurge, mas agora preciso mais do que nunca assistir no cinema, assim que conferir na tela vou voltar para ler o post de novo, para entender ainda melhor. E essa cena da luta entre o Batman e o Bane "onde ouvimos apenas o som da luta rolando e da água do rio correndo." que você citou... não paro de imaginar, tenho que ver, tenho que ver! rsrsr. Post bom demais! Valeu Gabriel!

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  2. Como falei, gostei da crítica, principalmente pelo apanhado dos filmes anteriores e por ter evitado spoiler. Você escreve bem, continue postando!

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  3. Parabéns, Gabriel!Ótimo texto!Sou suspeita, mas os elogios acima não me deixam mentir!

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  4. Parabéns pelo resgate histórico dos outros filmes e pela análise deste último. Quanto à última cena, acho que ela simboliza a alegria de Alfred ao ver Wayne finalmente se libertando do seu personagem. A ausência de comunicação entre ambos (real ou imaginária), apesar do carinho que os une, já havia sido descrita por ele como "um sonho" que ele tinha em todas as suas férias, e é necessária para pontuar a nova fase de Bruce, na qual Alfred é mero expectador de sua vida "normal". No mais, concordo em tudo com você, e gostei muito de seu nível de vocabulário, percepção e narrativa. Continue assim!

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